Tubo de Ensaio – Composição [Interseções + Intervenções], um dos
mais de 100 projetos contemplados pelo Rumos 2013-2014, principal programa do
Itaú Cultural para o fomento e apoio à produção cultural do Brasil, tem como
próximo convidado o intérprete e coreógrafo João Fiadeiro. Ele vem a
Florianópolis para mostrar, pela primeira vez, um trabalho e dar a oficina Composição em Tempo Real. A etapa Intervenção 3, realizada entre 17 e 20
de agosto, prevê o espetáculo Este Corpo
que Me Ocupa, que será apresentado no dia 21 de agosto, às 20h, no Espaço
2, do Ceart (Centro de Artes) da Udesc (Universidade do Estado de Santa
Catarina).
Fiadeiro, que em 2013 esteve em Florianópolis para ministrar
aula no 6º Múltipla Dança – Festival Internacional de Dança Contemporânea, pertence à geração de coreógrafos que
surgiram no fim da década de 1980. Seguidor do movimento pós-moderno americano,
bem como a Nouvelle Danse dos franceses e belgas, deu origem à Nova Dança
Portuguesa. Parte da sua educação
e formação ocorreu entre Lisboa, Nova York e Berlim. Integrou a Companhia de Dança de
Lisboa (1986-1988) e o Ballet Gulbenkian (1989-1990). Em 1990, fundou a Companhia RE.AL que
apoiou a criação de seus próprios trabalhos, apresentados em diferentes países
da Europa, nos EUA, Canadá, Austrália e América do Sul.
Iniciado em fevereiro, Tubo de Ensaio se estende até outubro,
com convidados do Brasil e do exterior. Coordenado
por Jussara Xavier, Sandra Meyer e Vera Torres, a intenção é aproximar a dança ao
teatro, as artes visuais, o cinema e a música. O projeto também pretende
estabelecer interseções de conhecimento nessas áreas
com artistas e pesquisadores, compartilhar e problematizar procedimentos de
composição – definida pelas idealizadoras como modo de reunir, produzir,
dispor, inventar, combinar, arranjar. Nessa perspectiva, a vinda de Fiadeiro é
oportuna sobretudo por sua experiência como criador do método de Composição
Tempo Real.
Em 2008, Fiadeiro interrompeu a atividade de coreógrafo e
autor para desenvolver projetos nos quais o processo - opondo-se ao produto –
aparecia como objeto central, uma mudança que condicionou o programa
desenvolvido pelo Atelier Real, no qual é diretor artístico. O Tempo Real, inicialmente concebido
para apoiar a escrita e a composição dramatúrgica de suas obras, transformou-se
numa ferramenta e plataforma teórico-prático para entender e repensar decisão,
a representação e cooperação na arte e na vida. Essa investigação desenvolve-se em
sintonia com outras disciplinas, como a economia, neurobiologia e ciências de
sistemas complexos, e tem sido tema de oficinas em escolas e universidades
nacionais e internacionais.
A oficina Composição em Tempo Real oferece gratuitamente apenas 25 vagas. As aulas ocorrem de
17 a 20 de agosto, entre 9h e 13h, na Sala Espaço 2 do Ceart na Udesc. Na
definição de Fiadeiro, Composição em Tempo Real é um sistema que serve tanto para o treino e a prática
da improvisação, como para a aplicação na criação de projetos performativos.
Para além da apresentação de um conjunto de vídeos síntese e
a apresentação de gráficos que traduzem os princípios e as premissas da
prática, serão propostos alguns exercícios tanto na escala-maqueta de forma que
os participantes poderão testar, manusear e experimentar os princípios dessa
ferramenta. O objetivo é alargar os limites de envolvimento do corpo em ato e o
grau de exigência das suas contribuições enquanto improvisadores. A ambição
deste workshop será "crescer para o interior" dessa prática, ou seja: ganhar
velocidade (de reação) e complexidade (na relação), sem perder precisão e
simplicidade no gesto. Informações podem ser
obtidas pelo e-mail tubodeensaiofpolis@gmail.com e as inscrições estão abertas em www.tubodeensaio2015.com
Investigação em torno do volátil
Este
Corpo que Me Ocupa (2008-2014) fecha, de certa maneira, um ciclo iniciado
há 11 anos com o trabalho I am Sitting...,
período em que João Fiadeiro se dedicou a múltiplas interfaces, como projetos
de criação, ateliê de investigação, workshops de formação, e da plataforma
prática-teórica que a Composição em Tempo Real proporcionava - experimentar e
sistematizar novos modos de colaboração, composição e criação artística. Assim,
o trabalho posiciona-se enquanto peça-tese, na qual Fiadeiro, em colaboração
com Paula Caspão, tenta sintetizar na equação mais simples possível, aquilo que
o inquieta enquanto artista e investigador.
"Se tivesse que reduzir, numa só palavra, o
meu 'modo de operação', aquilo que me move e me define enquanto artista, diria
que funciono e trabalho com o resto", explica Fiadeiro. O resto, segundo ele, é
aquilo que fica, que foi esquecido (porque não existe crime perfeito). "O resto
é o que cria vazio. E é a prova da ausência de uma presença. Ou, melhor ainda,
é a presença de uma ausência. É no resto que vamos encontrar os rastros para iniciar
a impossível tarefa de re-construir o mundo, uma e outra vez. Atrai-me a ideia
de saber que algo esteve antes de mim e que o que ficou, resistiu. O resto é
também o que está entre o corpo e 'a presença do outro no corpo', uma fuga
permanente para coisas que ainda não são, que podem ser. É nisso que penso: em
como dar a ver o que não está lá. Como trabalhar com uma matéria tão volátil
como o vazio. Como apresentar o 'entre' das coisas. E, pior ainda, como
representá-lo?."