sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Sou responsável pelo meu corpo


Quem já participou de alguma aula de dança comigo, deve-se lembrar do momento que peço para que falem seu nome e em seguida façam a afirmação: “Sou responsável pelo meu corpo”. Depois de aproximadamente dois meses participando do trabalho voluntário de atenção às pessoas sem-teto, apresentei para o pastor e os outros voluntários a ideia de um trabalho corporal, com intuito de se perceberem como seres singulares na pluralidade humana. Uma busca de compreensão sobre o nosso processo de vida. Compreensão, essa tão bem discutida por Hannah Arendt, para essa autora, trata-se de um processo complexo, ou seja, uma atividade interminável, por meio da qual, em constante mudança e variação, aprendemos a lidar com nossa realidade, reconciliamo-nos com ela, isto é, tentamos nos sentir em casa no mundo. (...) A compreensão é interminável e, portanto, não pode produzir resultados finais; é a maneira especificamente humana de estar vivo, porque toda pessoa necessita reconciliar-se com o mundo em que nasceu como um estranho, e no qual permanecerá sempre um estranho, em sua inconfundível singularidade. A compreensão começa com o nascimento e termina com a morte.

Aceito a proposta, comecei então pedindo para que todos/as atentassem para o exercício que era bem simples, mas que era de grande valor. Solicitei que cada um falasse seu nome e em seguida falasse a frase: sou responsável pelo meu corpo. E assim, cada pessoa ali presente foi pronunciando a frase, uns em inglês, outros em afrikan, outros em Xhosa, e eu em português. Algumas pessoas se levantaram e falaram em voz alta. Outras sentadas, falaram pausadamente, outras sussurraram, e teve uma pessoa que disse com honestidade, que não se sentia responsável pelo seu corpo, porque fazia coisas que não fazia bem para o corpo: bebia, fumava, às vezes era violenta e pediu que orasse por ela. Sua sinceridade foi inspiradora, saímos dali refletindo sobre como somos ou podemos nos tornar responsáveis pelo nosso corpo, ao ponto que o nosso ser-no-mundo seja equivalente com o ter do mundo. Nilton Bonder nos ensina que a vida se dá na tensão entre o ter e o não ter. O gratuito é o “não ter” que devemos estar constamente considerando junto com o que “ter”. Se não considerarmos a possibilidade de “não ter”, vamos perder todas as oportunidades do que é gratuito neste mundo.

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