quinta-feira, 9 de junho de 2011

Perceber, Sentir, Agir

Escuto a Fine Music Radio sul-africana que sintonizo na internet, aqui na sala 210 da cottage, o cheiro da maçã dilui-se no ar, agora na mesa observo o vaso com belas rosas vermelhas, ao fundo árvores, um pinheiro, com diversas tonalidades de verdes, contrastando o azul do céu outonal, hoje ensolarado. Sinto uma alegria infantil. Escrevo. Falo no telefone com a Tamara sobre a bela experiência de ontem quando juntas compartilhamos a experiência de dança com a turma de 24 meninos e meninas e adolescentes com surdez, a maioria negra. A escola dominicana situada numa das costas marítimas da montanha, belíssimo lugar. A aula foi inspirada em Laban. E aprendo que quanto menos informação oral melhor. A turma era oralizada e fazia leitura labial, a maioria usava aparelho. Então, começamos fazendo uma série de movimentos rápidos e intensos. Em seguida pedi para atentarem para a respiração e a batida do coração. Observaram um cenário. Descreveram para o colega. Pegaram de maneira não usual uma concha num cesto. Devolveram a concha imitando um deles. Depois nos locomovemos pela sala assumindo diferentes posturas corporais. Foi bem divertido. Em seguida, um exercício de confiança, guiar o colega pela sala. Avisam que temos cinco minutos para encerrar a atividade. Distribuímos fotocópias de fotografias de dançarinos, dançarinas sete grupos foram formados e numa rápida articulação todos se apresentaram reproduzindo o que viam na fotografia. Terminamos o trabalho com a ciranda da gratidão. Ganhamos uma caixa de chocolates. E as caronas para chegar e sair de lá da escola, resumo que foi mais uma aventura.

Aqui na School estamos num período de exames. Trata-se de um período que todo o sistema educacional sul-africano está em exame. É uma estrutura interessante. E todos parecem corresponder as expectativas. Os estudantes se preparam. A biblioteca amplia os horários de atendimento e coloca avisos e desejos de ótimos exames. Tenho acompanhado alguns exames, chegam examinadores externos e o diretor da escola acompanha e avalia cada disciplina. Eu e a pequena temos ido assistir os exames da turma do segundo ano de coreografia ministrada pela professora Lindy Raizenberg, no teatro do Hiddingh Campus. Muito interessante ver os dois lados de uma mesma moeda, os estudantes enquanto coreógrafos e por outro lado vê-los como dançarinos. Hoje pela manhã acompanhei o exame do Perfomance Studies I, ministrada pela Rob Baum’s. Creio que foi pela primeira vez que vi aproximadamente 30 estudantes sendo avaliados simultaneamente e serem arguidos, em exercícios de improvisação. O que acontece com o corpo quando é aquecido? Em relação ao equilibro e quedas, o que a pessoa pensa ao subir e ao descer do apoio (as costas do colega). Ao observar um grupo realizando uma atividade de sustentação, descreva o que viu...

A música nos meus ouvidos, o cheiro da maça, a cor da rosa, o sentimento alegre, a escrita sobre aulas e exames de dança, essas experiências me faz lembrar das lições fenomenológicas sobre a noção que temos do mundo o qual habitamos é ao mesmo tempo pré-reflexiva e reflexiva. E a pequena por perto me faz testemunhar que as crianças percebem o mundo antes de pensar sobre ele. Anuncia a presença de um mundo anterior ao pensamento reflexivo, afinal nem sempre estamos a refletir sobre os nossos atos e sobre o mundo em que vivemos. Merleau-Ponty recomenda que é preciso recolocar o pensamento entre os fenômenos da expressão, superar o dualismo entre o pensar e o sentir. Reconhecer que todo conhecimento presente em nossa consciência passou primeiro pelas portas da percepção. Essa unidade dos sentidos proposta pelo filósofo é possibilitada pela conformação global de nossas sensações, de modo que posso saborear a forma da maçã, tocar o vermelho da rosa, ver a música no corpo que dança, cheirar o som do atabaque...

2 comentários:

  1. Obrigada professora, por compartilhar seus pensamentos sobre a dança e o corpo, leio sempre suas postagens.
    Namaste!

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  2. Grata também querida, por sua disponibilidade!
    Namaste!

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