terça-feira, 27 de maio de 2014

O dançar e o tempo

O dançar e o Tempo
O Festival Internacional Múltipla Dança, na tarde de terça-feira, iniciou-se com um diálogo entre o Alejandro Ahmed, Lilian Vilela e Denise Stutz,   acerca da pesquisa biográfica em dança.  No auditório do Centro de Desportos  da UFSC, um público de estudantes, dançarinos, pesquisadores e professores tiveram  a oportunidade de ouvir, conversar sobre a articulação da  narrativa com o tempo e explorar como  uma escrita biográfica auxilia a dar forma à experiência humana. A pesquisadora  Lilian Vilela  descreve  seu processo de escrita biográfica sobre a dançarina Denise Stutz, registrando uma intrincada teia textual entre memória, corpo e escritura. A composição do diálogo coloca lado a lado aquela  que escreve a respeito da vida  daquela que dança.  E Denise Stutz, também presente na conversação, desvela que sua história  e sua memória estão  presentes mais  em seu  corpo que em suas palavras. O coreógrafo e dançarino Alejandro Ahmed, permite que sua trajetória de vida embaralhe-se com a da Companhia de Dança Cena 11,  busca apreender  a  biografia como comunicação de ideias do corpo presente no tempo e no mundo. Por conseguinte, a narrativa no contexto da dança expõe os eventos dentro de uma ordem particular e  nos faz perguntar  como o corpo lembra?
Ao trazer em cena a biografia no contexto da dança, seja ela escrita na carne,  ou palavras verbalizadas, o Múltipla Dança sugere o exercício  de vasculharmos nossa atitude perceptiva e tentarmos  identificar como o tempo afeta a nossa compreensão de nós mesmos. Essa busca da temporalidade ancorada na interrogação  prioriza a descrição da experiência vivida.  Tal conhecimento incentiva a leitora e o leitor   contar  diferentes estórias sobre si mesmo no transcorrer da vida. Surpreendentemente, a narrativa sobre a vida  de cada um de nós mudará durante o tempo que estivermos vivos. O  que se mantém, o que se modifica na existência, e no corpo, que cria a sensação dessa dança escorrendo entre os dedos do tempo vivido?
Cia  de Dança Esther Witzman Foto de Cristiano Prim
Indagação essa que  Alexandre Bhering, Marcelo Lopes, Mônnica Emilio, Peter Mark, Vandré Vitorino, elenco da  Companhia de  dança Esther Weitzman,  encorajou  a plateia  pensar  ao apresentar a coreografia  intitulada  O Tempo do Meio. Dirigido por Esther Weitzman, o espetáculo de abertura  do Múltipla,   enfatiza a valorização do movimento como um acontecimento único e inusitado, chamando atenção, por exemplo,  para o instante  entre o passo e o estalar dos dedos do dançarino, na composição  do silêncio circunscrito na musicalidade de Jean Jacques Lemêtre, no qual o tempo nunca passa.   A pausa revestida pela luminosidade impressionista  de José Geraldo Furtado e as transposições do movimento entre os corpos que ali no  cenário  de Leo Bungarten  são traduzidas na leveza e no vazio, descortinam um esperar para compreender. Para o corpo que dança,  o instante não é uma ficção, e sim, o ponto  em que um gesto se acaba  e um outro começa.
Ida mara Freire ida.mara.freire@ufsc.br Professora Associada  do Centro de Ciências da Educação da UFSC. Pós-Doutorado em Dança pela Universidade  da Cidade do Cabo, África do Sul.

Nenhum comentário:

Postar um comentário